No meio das trevas e bafo pesado de cumplicidade que paira naquela cave, Maria levanta os olhos em direcção à trémula luz que se debruça sobre o abismo e esforça-se para aumentar a amplitude das pernas. Os olhos cheios de lágrimas aprisionavam os gritos da carne, que ao rasgar ecoava naquele negrume sem encontrar saliência onde se agarrar.
De repente os seus ouvidos ficaram surdos e as sombras começaram a dançar à sua volta, lentamente. O suor escorria-lhe pelo rosto, deslizava pela testa de ébano e deflorava-lhe os lábios sanguinolentos e depois, adocicado pelo néctar, precipitava-se pelo queixo abaixo até se quedar junto aos seios, que ela espremia vigorosamente. E como esguichavam, criando uma imagem de paranóia sob o calor daquela lâmpada amarelecida.
A carne dá de si finalmente e liberta cá para fora o primogénito. No entretanto em que a porta da cave se abre e inunda o lugar com algo mais que não luz.
Ele aproxima-se devagar sobre o olhar apavorado de Maria. Assoberbada pela confusão de ter desaguado de si mesma, e pelo sentimento de culpa que pulara para fora de si, tornando-se óbvio, cerra o punho com força e morde-o. Cerra as pálpebras e direcciona os olhos para o céu. Engole uma larga golfada de ar e espera...
-Mas é branco?
-Sim.
-Branco?
Maria refugia-se no poço do mutismo.
-Errar é humano, perdoar é divino, sabias?
E deixa aquele sorriso irónico suspenso pela escuridão, fechando a porta atrás de si.