terça-feira, 5 de agosto de 2008

a rapariga que me constatou o outono...


E enquanto eu estava sentado no meu sofá vermelho no meio da relva,bem longe de todas as árvores e de tudo que fosse qualquer coisa,vejo uma rapariga a vir bem na minha direcção,pronta a dizer-me o que quer que me quisesse dizer.
Trazia,preso por uma corrente,um grande porco cinzento,majestoso e altivo,tanto que por momentos não percebi quem conduzia quem.
Ela vestia uma túnica branca com uma renda confusa e uma gargantilha negra com vários e cristalinos diamantes em falta.O seu sapato de verniz,grotescamente tortuoso,sondava,desnecessariamente,a terra por onde passava.A própria túnica parecia querer abandona-la,desfalecendo dramaticamente e permitindo que o ar lhe beijasse um seio,que por isso mesmo se mostrava hirto.
Parou a meio do caminho.Tirou da malinha de mão um baton que espremeu cinicamente de encontro aos seus lábios finos.Continuou.
Quando me pareceu que olhava para além de mim e iria passar sem nada me dizer,Parou.
O porco colocou-se de perfil,afilou-se como os cães de caça,propositadamente para a pose.
Ela olhava-me agora no fundo dos meus olhos.
O seu rosto entrara numa terna maresia de comoção.
-O porco aqui és tu.-Disse-me.
O seu animal olha-me com desprezo.
Uma lágrima azul cai-lhe do rosto e perde-se na finitude do meu olhar.
Olho para o chão e tento encontrar,pelo menos sorver alguma da substância daquela lágrima.
Olho de novo e já lá não está,nem ela nem a lágrima.
Respondo-lhe:
-Pois sou,pois sou.